Jovens que passam o tempo ouvindo mp3, iPod, cativos da “cultura gospel”, hoje, diferem muito do que era um jovem “presbiteriano”, “anglicano”, “metodista” ou “batista”, de duas décadas atrás. A maioria jovem pluralista evangelical, hoje, sabe o nome das “divas” do gospel recente (Ana Paula Valadão é a pastora mais admirada por jovens evangélicos, mas perde o primeiro lugar para o midiático Silas Malafaia); cita de cor o nome das bandas gospel, mas não sabe quantos livros tem a Bíblia; quantos e quais são os livros dos profetas; o que é a Torá judaica no AT ou a que parte da literatura bíblica está vinculado o livro dos Salmos. Menos ainda, personagens evangélicos decisivos como John Wesley, Cranmer, Calvino, John Knox e Lutero (Tomaz Münzer seria pedir demais…), não representam nada nesse ambiente novo da juventude evangélica.
A vida dos mais pobres – devíamos dizer dos “sem-cidadania” – não tem nenhum valor. Não contam para a sociedade, que cada vez mais se parece com as do mundo chamado desenvolvido. A massa de pivetes, crackeiros, traficantes de cocaína, vê nos ricos apenas consumidores de drogas, e “trabalham” pra valer para atendê-los. Formam-se vocações para assaltantes, estupradores, assassinos gratuitos, à margem e ao mesmo tempo dentro da sociedade que dela parece depender. Chico Buarque ironiza o comportamento desses “agentes do consumo”: “Quando, seu moço /nasceu meu rebento / não era o momento / dele rebentar / já foi nascendo / com cara de fome / e eu não tinha nem nome / pra lhe dar”. Conheço o caso concreto da jovem rica do Leblon, com nome de celebridade, cujos pais vivem a maior parte do tempo na Europa gastando eurodólares, que conhece todos os pontos de venda de droga do Vidigal, e dos inferninhos da zona sul, no Rio.
Um mundo agonizante, como diria Hannah Arendt, criado pelo desvario quanto ao sentido da vida, onde a insensatez é constantemente renovada. Chocante, no Brasil, não é tanto a truculência das agressões noticiadas ao lado dos casos de milionários jogadores de futebol que não sabem o que fazer da vida, enquanto alugam patentes militares como segurança ou quebra-galhos nos seus frequentes deslizes. Chocante é a ausência de indignação com tudo isso. A tragédia da salvação individual gera desconforto com os problemas do trânsito, onde mortes violentas são cometidas diariamente por membros das classes bem-postas, mas desconhece bolsões de fome, miséria e doença, nas metrópoles e no interior do país (cf.vídeo).
O ideal da “boa vida” oferecida aos jovens paralisa-os num estado de ansiedade permanente, responsável, em grande parte, pela incapacidade que têm de olhar para outra coisa que não a si mesmos (já começou o Big Brother/2012 com transmissão 24 hs/dia no canal Multishow). A rede de atendimento aos “famintos de felicidade” tornou-se um negócio rendoso, e os usuários, para mantê-la, exigem mais exploração dos que já são super-explorados. Ecstasy, viagra e fast-food são símbolos da excitação permanente em que se mantém os jovens (Dasílio, Pedagogia da Ganância, em preparo).
É expressiva a multidão de “especialistas” em felicidade sexual, amorosa e química que, em coro, propagam e reforçam na mídia o mito da salvação individual, num Brasil moderno, informatizado, liberalizado eticamente e com todos os problemas resolvidos, de antemão, pelas leis do mercado. Há receitas e locais de aviamento para quem quiser. Notória, a cultura narcísica no Brasil, “acha” o país o melhor do mundo: nosso futebol, nossas praias lindas; nosso cachorro é o mais manso, nosso gato tem o pelo mais macio, nosso passarinho canta mais bonito, e agora nos faz arrotar como potência econômica entre o cinco maiores do mundo. Tudo isso fez com que os afortunados se apaixonassem pelo lixo e as inutilidades que produzem, tornando-se seus cúmplices e reféns.
Criou-se um círculo vicioso, onde a demanda por cuidados com a juventude, a beleza, a forma física, a realização sexual e o bem-estar perene, substituem vocações para a vida cidadã, responsabilidade social e solidariedade. Nutre-se da miséria econômica dos mais pobres, ou remediados, e alimenta-se da miséria psíquica dos ricos. Além do mais, paralelamente à inibição da esfera pública, a cultura produz a desagregação das próprias instituições encarregadas de proteger o parco quinhão da “felicidade de shopping-center” (Jurandyr Freire). O cenário dramático dos que vivem com 2 “real” por dia, no Brasil, ou à custa da bolsa-família (paliativo provisório em caráter de esmola social, porém com certo valor — melhor ter que não ter –; trabalho, saúde assistida com qualidade, urbanização humanizada, são mais importantes, para se evitar a pobreza viciosa, dependente e a imobilidade: “ninguém se liberta sozinho…” – Paulo Freire); a ignorância sobre 13 bolsões de miséria, 600 municípios, sem urbanização, hospitais, escolas, 20 milhões de pessoas vivendo sob todas as fomes do mundo… mostram que o palco não foi desmontado.
João 1,43-51 – Discípulos de João escutam-no expressar-se sobre Jesus, o “cordeiro de Deus”. Sem vacilações, na mesma forma ingênua do jovem Samuel (1Sm 3,1-20), sem perguntar, de antemão sabendo os significados dos compromissos e das mudanças em suas vidas, ao optarem pelo caminho de Cristo. O diálogo que se entabula entre os “vocacionados” e Jesus é significativo: “Que buscas?”; “Mestre, onde vives?”; “Venham e verão” (35-36; 39). E logo são acolhidos. O gesto simbólico diz muito: não basta proferir uma lição teórica sobre quem é Jesus, como forma de evangelização. É preciso testemunhar pessoalmente sobre os significados, os valores, o sentido da vida em comunhão com Cristo. Seguir a Jesus é estar pronto para o impacto da experiência de Deus ampla e sem restrições, que envolve a vida imersa no mundo, por inteiro. João dirá, mais tarde, sobre uma oração de Jesus: “Pai, não te peço que os tires do mundo, mas que os guardes do mal”. As vocações existem e necessitam ser despertadas.
Natanael, depois de duvidar das qualidades do homem de Nazaré – lugar do interior palestino tradicionalmente desprezado pelos judeus, por questões históricas e raciais –, ouve sobre Jesus e convence-se de que ele é verdadeiramente o filho de Deus, o Messias esperado para mudar o mundo. O reinado de Deus está começando, muitos ouvem o chamado, conscientemente. A vivência do homem de Nazaré, testemunhando o projeto de salvação, de Deus, causa impacto na vida de qualquer um. Muitos se comovem, quando tomam conhecimento da abrangência da proposta de Deus de transformar o mundo, os pensares humanos; visão sobre o que acontece nos escalões do poder político; visão sobre partidos e governos que comandam o destino de milhões de pessoas; sobre dirigentes comunitários vendidos, religiosos que manipulam votos dos crentes e tornam igrejas em “laranjas” de políticos corruptos, ensinando a roubar da nação. Visão para a compreensão da economia de um povo inteiro, suas necessidades, carências e urgências; para mudar o entendimento do papel não cumprido pelos legisladores e juízes, pastores do povo, mancomunados na opressão. Mudar o modo de ser religioso acompanhando e defendendo o modelo dos exploradores, em acordo com o poder e a cultura do opressor. Onde estão as vocações?
Derval Dasilio disse:
Fui convidado para pregar na IPU-Maruípe, neste domingo (2o. do Tempo Comum depois da Epifania). O texto, adaptado para o púlpito, ficou assim:
VOCAÇÕES QUE CHAMAM A ATENÇÃO
(João 1,43-51) O que buscam vocês na vida? Venham, vejam um caminho de salvação.
Discípulos de João escutam-no expressar-se sobre Jesus. O diálogo que se entabula entre os “vocacionados” e Jesus é significativo: – “Que buscais na vida?”; e eles: “E tu, Mestre, onde e do que vives?”; “Venham e verão” (35-36; 39). E Jesus vai nos mostrar que o ideal da “boa vida”, felicidade, oferecida aos jovens paralisa-os num estado de ansiedade permanente, responsável, em grande parte, pela incapacidade que têm de olhar para outra coisa que não a si mesmos, seus corpos, roupas, calçados, celulares classudos… (começou o BBB/2012 – transmissão 24 hs/dia /Multishow).
• A rede de atendimento aos “famintos de felicidade” tornou-se um negócio rendoso, e os usuários, para mantê-la, exigem mais exploração daqueles que já são super-explorados. Ecstasy, viagra e fast-food são símbolos da excitação permanente em que se mantêm os jovens. Que há uma expressiva multidão de “especialistas” em “felicidade religiosa”, sexual, amorosa e química que, em coro, propagam e reforçam na mídia o mito da salvação individual, num Brasil moderno, informatizado, liberalizado eticamente e com todos os problemas resolvidos, de antemão, pelas leis do mercado (cartão de crédito, etc.).
• Há receitas e locais de aviamento para quem quiser. Notória, a cultura narcísica no Brasil, “acha” o país o melhor do mundo: nossa comida, nosso futebol, nossas praias lindas; nossas mulheres… Nosso cachorro é o mais manso, nosso gato tem o pelo mais macio, nosso passarinho canta mais bonito, e agora nos faz arrotar como potência econômica entre o cinco maiores do mundo. Tudo isso fez com que os afortunados se apaixonassem pelo lixo e as inutilidades que produzem, tornando-se seus cúmplices e reféns.
Criou-se um círculo vicioso, onde a demanda por cuidados com a juventude, a beleza, a forma física, a realização sexual e o bem-estar perene, substituem vocações para a vida cidadã, responsabilidade social e solidariedade. Nutre-se da miséria econômica dos mais pobres, ou remediados, e alimenta-se da miséria psíquica dos ricos. Além do mais, paralelamente à inibição da esfera pública, procura-se a “felicidade de shopping-center” (Jurandyr Freire).
Não contam para esta sociedade, que cada vez mais se parece com as do mundo chamado desenvolvido, a massa de flanelinhas, pivetes, crackeiros, traficantes de cocaína. Estes vêem nos ricos apenas consumidores de drogas, e “trabalham” pra valer para atendê-los. Formam-se vocações para assaltantes, estupradores, assassinos gratuitos, à margem e ao mesmo tempo dentro da sociedade que dela parece depender. Chico Buarque ironiza o comportamento desses “agentes do consumo”: “Quando, seu moço/nasceu meu rebento/não era o momento/dele rebentar/já foi nascendo/com cara de fome/e eu não tinha nem nome/pra lhe dar”. Conheço o caso concreto da jovem rica do Leblon, com nome de celebridade, cujos pais vivem a maior parte do tempo na Europa gastando eurodólares; que conhece todos os pontos de venda de droga do Vidigal, e dos inferninhos da zona sul, no Rio.
Natanael, um jovem ouvinte, vocacionado, depois de duvidar das qualidades do homem de Nazaré – lugar do interior palestino tradicionalmente desprezado pelos judeus, por questões históricas, raciais, sociais, como quem mora no Leblon avalia seus vizinhos do Vidigal; ouve sobre Jesus e convence-se de que ele é verdadeiramente o filho de Deus, o Messias esperado para mudar o mundo.
O reinado de Deus está começando, muitos ouvem o chamado, conscientemente. A vivência, o contato com o homem de Nazaré (aquele que vem de um lugar como Itararé, e não da Praia do Canto), testemunhando o projeto de salvação, de Deus, causa impacto na vida de qualquer um. Muitos jovens se comovem, quando tomam conhecimento da abrangência da proposta de Deus de transformar o mundo e os pensares humanos;
• Jesus oferece a visão sobre o que acontece nos escalões do poder político (o governador que foi lider estudantil, depois de eleito, manda carro de choque e policiais para espancar cidadão comuns na avenida);
• Jesus oferece a visão sobre partidos e governos que comandam o destino de milhões de pessoas funcionando nas igrejas que se tornam “diretórios” evangélicos; religiosos que manipulam votos dos crentes e tornam igrejas em “laranjas” de políticos corruptos, ensinando igrejas a roubar da nação, recebendo verbas sociais com reserva de propina…
• Jesus oferece a visão para a compreensão da economia de um povo inteiro, suas necessidades, carências e urgências (hospitais, escolas, justiça previdenciária); para mudar o entendimento do papel não cumprido pelos legisladores e juízes, pastores do povo, mancomunados na opressão (ministros que dão habeas corpus para criminosos ricos, que em seguida fogem para o exterior).
• Jesus oferece luz sobre 13 bolsões de miséria escondidos, no país: 600 municípios sem urbanização, hospitais, escolas, 20 milhões de pessoas vivendo sob todas as fomes do mundo… mostra que o drama não terminou, e o palco não foi desmontado.
Aos vocacionados, Jesus pergunta: “Que buscais? Venham, vejam um caminho de salvação”: “Buscai em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça…”. Nem mais nem menos.